Tuesday, November 10, 2009

A Parábola do Cinto


Existem várias razões para o nosso subdesenvolvimento. Uma delas, reside na nossa luta, inigualável penso, em aceitar que vivemos num mundo de probabilidades.

Muitos comportamentos podem ser determinados pelas probabilidades; podemos escolher algo ou aceitar o cumprimento de uma dada lei, com base na crença que temos das probabilidades. Sabemos que o uso de cinto de segurança nos automóveis, não garante - mesmo cumprindo todas as regras do código da estrada - que em caso de acidente, os ocupantes saiam ilesos do dito cujo. Mas dizem os números, que morrem mais pessoas sem cinto de segurança do que com cinto. Logicamente, não nos passa pela cabeça (por algumas passa, mas são felizmente, cada vez menos), deixar viajar crianças num carro sem o cinto devidamente colocado. Mesmo sabendo que o cinto não garante a vida eterna. Simples. Aceitamos o facto e não colocamos a vida dos pequenos, em risco desnecessário.

Quando introduzimos as probabilidades nos estilos de vida a coisa começa a emperrar. O consumo exagerado de álcool ou tabaco aumenta as probabilidades de contrairmos doenças graves. Se não incorrermos em comportamentos de risco reduzimos essa possibilidade. O que não impede que morram pessoas em idade jovem e que nunca tenham fumado ou bebido. Quem nunca ouviu a história do velho que morreu aos 98 anos e que fumava dois maços por dia? Passem no IPO e ouçam as histórias dos que fumavam 2 maços por dia. É óbvio, que o número de pessoas afectadas pelo tabaco, é muito maior do que os que fumaram a vida toda sem nada lhes ter acontecido. É interessante ouvir o argumento do velhinho vezes sem conta. Quando este argumento desaparecer demos um passo importante em termos de mentalidade. (PS: não me incomoda as escolhas que cada um faz, eu próprio não sou nenhum santo; não precisamos é de defender os nossos excessos para lá da racionalidade)

Outra barreira psicológica engraçada e relacionada com as probabilidades é o grau de habilitações. Dizem os números que quanto maior o grau de habilitações, menor o tempo no desemprego e maior o rendimento. Quando tenho esta conversa com alguém sou bombardeado com o primo que ganha 600 euros no call center, o filho que tirou Direito e é vendedor ou o amigo que tirou Arqueologia e está desempregado. É a realidade, muitas pessoas com cursos superiores, não trabalham na sua área de formação. É também verdade, que muitas universidades primam pelo facilitismo e que muitas pessoas que tiram um curso superior não adicionaram nada por aí além ao seu intelecto. Uma coisa é o que escrevemos num currículo, outra é o que de facto, evoluímos. A realidade, dura, é que muita gente, tirou o curso por tirar. Não estou a tentar desculpar a incapacidade do nosso mercado de absorver profissionais, mas este é um factor a ter em conta: se as pessoas não sabem dizer pão com queijo, não é por terem um curso que vão arranjar trabalho. De qualquer forma, e voltando ao argumento inicial, mesmo a mais insípida das aves raras, com curso superior (a não ser que seja Mergulho), mais cedo ou mais tarde, consegue emprego (outro motivo para não se arranjar emprego é o facto da capacidade de mobilidade das pessoas ser diminuta, traduzindo, ninguém quer sair do poiso onde nasceu).
Muitas pessoas que têm uma vida confortável não tiraram curso nenhum. Muitos têm a 4ª classe. São pessoas que têm o seu valor e que conseguiram lutar para ter o que queriam da vida. Pergunte-se agora quantos anos demoraram estas pessoas a chegar aonde chegaram? E a que preço? E quantos como eles ficaram pelo caminho? E que alternativas têm se algo correr mal?
Esta é a grande diferença; um arquitecto recém licenciado a trabalhar no Mcdonalds tem a perspectiva de sair dali. Um jovem que desistiu de estudar no 9º ano no mesmo Mcdonalds que perspectivas tem?
Tanto um como outro podem chegar longe na vida, o que tem o 9º ano pode até superar o arquitecto, mas em teoria, quem tem mais hipóteses? A teoria, goste-se ou não, quando provada, ainda que em estimativa, supera sempre a subjectividade da opinião.

Em 2009, discute-se por cafés em Portugal, se vale a pena tirar um curso ou se o tabaco faz mal à saúde. É interessante verificar que as mesmas pessoas a defender afincadamente estas posições são os que querem ver os filhos com um curso superior e nem sonham vê-los a fumar. Quando é que vamos começar a olhar para cá para fora, da mesmo forma que um cinto de segurança?

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